17 dezembro, 2010

Aquela Janela

Seria aquela, a janela da alma ou seria ela apenas o reflexo de uma memória nostálgica?
Quando criança, aquela janela representava um obstáculo
Eu tentava incansavelmente escalá-la, tentativas muitas vezes inúteis, pois quase sempre caía sobre as almofadas verdes com forro de cetim.
Vovó adorava me ver brincar na sala, mesmo quando por inúmeras vezes eu quebrava a mesinha de centro... e quando eu levantava e batia a cabeça na janela, ela batia na janela e a dor passava, avó também faz mágica.
Já meu avó sempre dizia - desse daí menina, você vai cair - aí hoje eu digo "é vovô eu caí muito e não foi só da janela"
O tempo foi passando e o significado daquela janela foi mudando de cor (o significado, porque que eu me lembre a janela sempre foi verde).
Nas tardes da minha infância, descia a rua da Escola Dr. Aurelino com minha Caloi amarela correndo até a casa mais querida da cidade e então eu via diante daquela janela Vovô Otacílio sentado com seu livro - cada dia um diferente – então aquela janela deixou de ser a da traquinagem e passou a se chamar “Janela da Sabedoria”.
Pouco mais adiante, passei a ser a dona daquela janela, por obra do destino e aquele cantinho passou a ser o ponto de encontro de muitas tardes e noites entre amigos da adolescência.
Nos encontrávamos para estudar, contar piada, marcar as farras de final de semana e muitas vezes para comer a pipoca que Vovó Ota fazia com tanto amor.
Aos poucos cada um foi deixando sua marca registrada naquela janela, nomes, apelidos, corações, desenhos e frases foram escritas nela, coisas de adolescente. Quantas vezes fui acobertada por Vovó que a deixava aberta para que eu não fizesse barulho ao chegar e Vovô ouvir, coisas de Dona Otacília!
Essas janelas marcaram a minha vida e a de muita gente e eu a defino assim:
Janela aberta
Vovô e seus livros
Gente na porta
Alguém sobre ela
Vovó feliz 
Eu satisfeita de ter aquela janela
Hoje ao ir de passagem a minha cidade, dentro do ônibus passando pela Av. Juracy Magalhães me bate aquela saudade, os olhos ficam marejados, pois vejo ali, aquela janela verde que um dia foi tão movimentada e colorida, hoje tão solitária e apagada.



Gisele Leite, 2010